Mulheres mobilizando cidades e mulheres, juntas!

Jun 28, 2018·7 min read

Leticia do SampaPé! esteve no evento inédito na Alemanha que reuniu mulheres do mundo todo que trabalham com mobilidade urbana e transportes para se conhecer e trocar

O que foi o Women Mobilize Women?
O “Women Mobilize Women” (em português “Mulheres Mobilizam Mulheres”) foi um evento de um dia (22 de maio de 2018) organizado pela iniciativa TUMI — Transformative Urban Mobility (Mobilidade Urbana Transformadora), liderado pela GIZ — Agência Alemã de Cooperação e fez parte da agenda de pré eventos do Fórum Internacional de Transportes da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).

Contextualizando: A OCDE é uma organização intergovernamental estabelecida em 1961 que atualmente conta com 35 países membros dos quais apenas três são de países com economias emergentes (México, Chile e Turquia). O Fórum Internacional de Transportes teve este ano a sua décima primeira edição e sempre acontece em Leipzig na Alemanha.

O evento propôs transformar a mobilidade a partir do empoderamento feminino e para isso reuniu mulheres dos diferentes continentes do mundo que trabalham com mobilidade urbana desde o setor público, empresas ou organizações da sociedade civil para compartilhar suas experiências e perspectivas como mulher. Partiu-se do pre-suposto que o meio dos transportes é dominado por homens e isso gerou e gera cidades injustas para a circulação e acesso das mulheres, evidente na frase que estava na programação: “Quando homens planejam os transportes, os transportes são planejados para homens” ( original: “When men plan transport, transport is planned for men”).

Como o evento se estruturou?

O evento se estruturou em falas de abertura, quatro falas inspiracionais (de 15 minutos cada), três painéis temáticos (de 1 hora e 15 min cada), uma sessão de diálogos que se parecia a um “speed dating” (momento que participamos) e entrega dos prêmios TUMI Awards. Além de almoço, coquetel no final e momento para a fotos oficial — sim, alemães são muito organizados e tem espaço na agenda dedicado a foto.

De onde eram as participantes?

O Women Mobilize Women contou com 22 palestrantes provenientes de 18 países (África do Sul, Alemanha, Áustria, Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, Estados Unidos, França, Gana, Índia, Libéria, Malásia, México, Nova Zelândia, Reino Unido, Sudão e Uganda) além de outras 20 apresentadoras de iniciativas práticas que participaram da sessão de diálogos (que além dos países já mencionados vieram também do Quênia, Rússia, Bélgica, Brasil — Letícia Sabino — e Egito). Que trocaram e interagiram com 200 participantes presenciais provenientes de 39 países, além de 1000 pessoas que acompanharam através da transmissão online.

Relato Leticia

Destaques do Evento

Foi muito difícil fazer uma seleção de destaques pela diversidade e riqueza das experiências compartilhadas no evento, mas por uma questão de extensão de relato selecionei algumas mulheres e experiências para mencionar — mas quem quiser entrar em contato e saber mais estou a disposição para compartilhar as experiências.

O primeiro destaque foi a mediadora do evento, Shreya Gadepalli, coordenadora do ITDP (Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento) na Índia e Ásia, que conduziu todo o evento com muita sabedoria e leveza destacando que haviam muitas perspectivas diferentes e como é importante as cidades e iniciativas de transporte terem perspectiva de gênero.

Na abertura me chamou atenção a fala da Julie Anne Genter, Ministra das Mulheres e Ministra Associada de Transportes e Saúde na Nova Zelândia, que destacou que ela e a atual primeira ministra do país serão as primeiras mulheres a estarem grávidas e terem filhas/os durante seu mandato em ministérios e o quanto isso não ser natural até hoje exclui mulheres de cargos de decisão.

Nos painéis houveram três participações inesquecíveis: Esenam Nyador da Gana, conhecida por Miss Taxi; Angela Anzola Secretária das Mulheres em Bogotá; e Kalpana co-fundadora do Safetipin na Índia.

Esenam relatou como iniciou sua carreira como taxista e que teve que fazer isso de forma independente que por ser mulher não era aceita nas cooperativas até os dias de hoje em que lidera treinamento para mulheres que querem ser motoristas no transporte público. A mensagem mais marcante dela foi para que sejamos “vírus do bem” e “contaminemos” nossos exemplos e coragem por aí.

Angela não é da área de transportes e atuava fazia dois anos com violência contra a mulher e por isso trouxe aportes muito valiosos de como o machismo estrutural se reflete e limita o dia a dia das mulheres nas cidades. E Kalpana co-fundadora do Safetipin negócio social que faz uso da tecnologia e de um aplicativo para avaliar o ambiente construído relacionando a sensação de segurança das mulheres e assim propor soluções para as cidades. Iniciativa que foi premiada no final do dia pelo projeto que estão realizado pela Secretária das Mulheres de Bogotá usando o aplicativo e as soluções do Safetipin.

Duas das falas inspiracionais foram de Mexicanas do poder público: Gisela Méndez, que foi secretária de transportes do estado de Colima, e Laura Ballasteros, que foi vereadora e é Sub-secretária de Mobilidade na Cidade do México. Ambas trouxeram a perspectiva das dificuldades de serem mulher em posições de poder lidando com este tema.

As sessões de diálogo, que participei, eram mais dominadas por organizações da sociedade civil que colocam a mão na massa nos seus territórios. Vale a pena ver o trabalho do Femibici de Guadalajara no México, do ITDP Índia, do Despacio e Open Streets Cape Town — as últimas duas fiz live com elas contando de suas iniciativas durante o evento.

Nossa participação

Participamos na sessão de diálogos que eram 12 mesas com suporte de banners onde os participantes podiam chegar para ouvir as iniciativas e fazer perguntas. A mesa que participamos era do Walk21, colegas de trabalho no tema da caminhabilidade e deslocamento a pé nas cidades, que estava representado pela Bronwen Thornton, que dividiu o espaço comigo (Letícia Sabino, SampaPé!) e com a Dana Corres da Liga Peatonal do México.

Neste curto espaço pude contar sobre o SampaPé! e outros movimentos de caminhabilidade no Brasil serem liderados por mulheres e do projeto que co-realizamos com a Rede MÁS, Mulheres Caminhantes, que colocamos mulheres do território como especialistas em segurança gênero em transporte sustentável para avaliar as condições dos deslocamentos e propor soluções.

Participação brasileira
Representantes do Brasil éramos três, além de mim, estava a Eveline Trevisan da BHTrans e a Renata Jardim da Prefeitura do Rio de Janeiro, que falam neste vídeo que gravei de lá. Mas ainda sem muito espaço de fala do Brasil, o que concordamos que sentimos muita falta e esperamos marcar presença com mais mulheres no próximo encontro deste tipo.

Mais do que uma conferência

O Women Mobilize Women também teve outros dois resultados muito importantes além de dar visibilidade para as mulheres trabalhando mobilidade urbana no mundo. O primeiro foi aumentar a participação feminina no Fórum Internacional de Transportes, que pela primeira vez teve programação com foco em gênero todos os dias do evento, com muitos debates qualificados.

E o segundo foi aproximar as participantes do evento, como estivemos todas hospedadas no mesmo hotel e com alguns programas especiais para nós (como um tour a pé pelo secretaría de transportes de Leipzig) tivemos muita oportunidade de nos conhecer e trocar para além de profissionais, como pessoas, e esperamos que isso gere encontros e projetos muito em breve.

Somos diferentes

Outra coisa que ficou muito clara com essa junção diversa foi que as regiões estão em momentos de empoderamento e desenvolvimento muito diferentes, e não só momentos diferentes mas tem caminhos diferentes a trilhar baseados nos contextos e cultura local. Enquanto em Gana o empoderamento pode ser representado por mulheres dirigindo uma vez que quase não há transportes públicos, na América Latina já estamos conseguindo relacionar transporte sustentável com gênero e reivindicar melhores transportes e ruas para se deslocar. Por isso é importante promovermos este tipo de encontros por regiões, conseguindo avançar em pautas comuns e firmar compromissos.